Ana, a Doadora


De uma forma ou de outra, os livros – ficcionais ou não – levam-nos a viajar e a refletir sobre um certo número de temáticas. Contudo, são raros os que têm o mérito de nos pôr a pensar criticamente sobre nós próprios.

Não foi difícil encontrar o meu perfil de doadora, logo nas primeiras páginas. Antes de fazer o teste online que Adam Grant sugere, já tinha uma noção clara do peso que o meu lado “giver” tem sobre o tomador e o compensador. Desde que me identifique com os seus valores, a pertença a um grupo sempre foi de extrema importância para mim: contribuo com o meu trabalho, o meu tempo, coordeno, mentorizo e nunca frustro as expetativas dos meus pares.

Depois de elencar os benefícios de se ser doador, o autor chama duramente a atenção para os perigos: exaustão, desilusão, a frustração de nunca chegar ao topo… Mais uma vez, encontrei-me…

O desafio é então o de encontrar o sempiterno equilíbrio. Ser-se doador, sim, ma non troppo. Há que abrandar o ritmo, e jamais – em circunstância alguma – esquecer os nossos próprios interesses. Como tudo o que toca o tal do equilíbrio, mais fácil dizer do que fazer…

E há uma questão que não é abordada no livro e que me interpela de sobremaneira: o facto de algumas pessoas fundirem o seu interesse pessoal no interesse do grupo, quase deixando de ter vida própria, nunca se negando a nada, nunca desiludindo ninguém, além delas próprias…

São indivíduos trabalhadores, que veiculam fortes convicções no seio de um grupo, convicções essas que não conseguem concretizar na sua esfera pessoal e mais íntima. Fazem-me lembrar aqueles vendedores de programas alimentares da Herbalife que andam com o autocolante no carro, lideram as vendas do seu grupo, mas não conseguem atingir o peso ideal… São uma referência entre os seus pares, mas, quando entregues à sua solidão, concluem que não aplicam o que preconizam, sem nunca entender porquê.

Foi isto que faltou no livro (além de uma boa tradução…). Faltou dizer ao vendedor da Herbalife de que forma é que ele atinge o peso ideal e pode sorrir de auto-satisfação, não apenas pelo que fez pelo grupo, mas – e sobretudo – pelo que fez por si próprio.

Desconfio que tal descoberta seria de envergadura semelhante à da pólvora.

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