A libélula

Na hora em que arranco estas palavras ao teclado, pesam-me os olhos e persiste uma acidez na garganta, a dos excessos.
Deve ser o não hábito da solidão ou a consciência do fracasso. Não sei.
Os pensamentos atropelam-se. Penso nele, no desfecho sem fim à vista da tragicomédia em que a minha vida se transformou. E penso nela. Na libélula. Neste símbolo de transformação, de liberdade, de força.
Ainda na ninfa, debate-se, agressiva e predadora. Liberta do seu casulo, resplandece e impõe a beleza e a finura das suas longas asas. 
Dizem as más línguas, que a fêmea é uma meretriz e que o macho fura olhos e pica cavalos. Disso nada sei. Sei apenas que o humano tem uma propensão para acreditar em boatos que denigrem, acrescentando-lhes um ponto.
Pouco ou nada corre sobre a sua estratégia de contornar obstáculos. Ao que parece, aqueles amantes da fauna que se vestem da cor do cenário que investigam e usam objetivas fotográficas do comprimento de um braço, terão descoberto que este minúsculo dragão voador não sabe recuar.
Frente a um obstáculo, do eixo onde se encontram, investem à direita, investem à esquerda, para cima ou para baixo. Nunca para trás. Nem para ganhar balanço ou perspetiva. Não carregam passados. Não destilam frustrações. O seu único desiderato é avançar.
E eu, se, por um lado, lhes admiro (e até invejo...) a falta do conceito, por outro, tenho de admitir que é dos recuos que arranco estas e outras palavras.



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