Sequelas



A inconstância corrói.
A incerteza vai deteriorando a superfície de uma força aparente.
Num dia, damos por nós a pensar em todos os contornos do plano B, C, D… No que faremos, nas atitudes que tomaremos, nas posições que assumiremos.
Noutro dia, investidos de uma positividade sem origem conhecida, achamos que tudo é um disparate, que tudo vamos vencer, que tudo vamos conquistar.
Depois, há os dias assim-assim.
Os que começam bem, mas durante os quais o desgaste e a impaciência se instalam.
Ou o contrário: os dias que começam mal, mas que são gradualmente povoados por pequenas conquistas, pequenos sorrisos, pequenas palavras.
Difícil também é gerir esta nossa fase negra em confronto com os outros. Aqueles que acham sempre que somos exagerado/as, que gravitam à nossa volta um milhão de pessoas mais desafortunadas, mais pobres, mais doentes, mais mal-amadas…
Como se não soubéssemos…
E fingimos que sim, que de facto é assim, mas continuamos, internamente, a destilar a mágoa e a incompreensão.
Depois, há outra categoria de “outros”. Aqueles a quem ocultamos a dor, porque não devem de modo algum saber, porque os amamos e não queremos ser para eles uma fonte de preocupação, ou porque, simplesmente, não queremos macular a imagem imperfetível que têm de nós.
Há também fases de total irracionalidade, em que damos por nós a acreditar em mandalas, pragas, males de inveja… Como se fôssemos assim tão importantes!
Ou aquelas fases em que procuramos desesperadamente a nossa responsabilidade, a linha do guião que saltámos, o pecado que cometemos…
Busca inglória!
Ou aquelas fases em que procuramos desesperadamente alguém que possamos modelar, a quem nos possamos agarrar, mas tudo e todos à nossa volta nos desilude(m) e perde(m) o brilho. Até parece que ficamos equipados de um dispositivo de leitura extra-sensorial que apenas realça aquilo que só nós vimos, porque sim: vaidades, egoísmos, insensibilidades.
Sem razão, sem resposta, sem data de vencimento, a única certeza é que não saímos incólumes destas batalhas. As sequelas perduram. Umas boas, outras más.
Há sequelas boas?

Comentários

Rita disse…
Adorei este texto!
=)
Ana Bela Cabral disse…
Obrigada, Amiga!

Então, já valeu a pena escrevê-lo. ;)

Beijo!

Mensagens populares deste blogue

Sim

Longe daqui

O Mundo Dela