A Fã



Já fora da gelataria e longe de olhares e ouvidos indiscretos, a senhora e a jovem que mencionou ser sua filha proferiram as palavras mágicas: sabemos onde Ele mora.

Explicou-nos que a vila se unira na promessa de assegurar a sua privacidade, não dando essa informação aos visitantes. Já bastava o assédio dos jornalistas e a especulação à volta de tudo o que lhe dizia respeito. Ele vinha pouco a casa, mas, quando vinha, gostava de se sentir verdadeiramente em casa. Fora o facto de ter uma das três filhas a viver na América e desta ter sido sempre bem acolhida e auxiliada pelos Americanos que levou aquela mãe de família a querer mostrar-nos o caminho.

Seguimos o caro delas durante minutos que me pareceram intermináveis. Apenas me lembro que o carro era grande e cor de vinho, que circulava devagar; lembro-me também de atravessar infinitas planícies e um lago pitoresco (ou será o lago pitoresco fruto da minha imaginação?).

Finalmente, o carro encostou numa berma, o nosso taxista encostou atrás e saímos todos. Do outro lado da estrada, lá estava ela, simples mas imponente, a casa do meu ídolo. Foi-nos explicado que aquela era uma zona de agricultores e que a terceira filha da família casara com um dos filhos dos vizinhos. Despedimo-nos com agradecimentos eternos e as duas britânicas arrancaram. Não queriam ser vistas por ali.

O que se seguiu foi muito rápido. Tocámos à campainha e ninguém atendeu. Tirámos fotos de todos os ângulos e feitios. Escrevi apressadamente uma carta que a minha mãe me ditou – pois eu não conseguia processar qualquer tipo de informação – e enfiei-a na caixa do correio. Ele teria nas mãos uma carta que eu lhe escrevi!

Na viagem de regresso, depois da euforia do reconto, instalou-se um longo silêncio. Revi as etapas desta aventura e demorei-me com emoção na cumplicidade daquele povo, no secretismo à volta da Sua morada. Sem hesitação, tomei a palavra, dirigi-me ao taxista e disse:

- Promete-me que nunca divulgará a morada Dele?

Cumpriu a promessa. Nunca ninguém soube onde Ele morava. Nunca mostrei aquelas fotos a ninguém, nunca disse que estivera em Sua casa e nunca mencionei a carta que escrevi. A minha devoção ultrapassava todo e qualquer exibicionismo.

Lisboa, 4 de abril de 2015
À minha filha Sara


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